*Paulo Sergio João
O 1º de maio de 2020 se repete em 2021 em clima de crise ainda maior. Este período de pandemia tem afetado de modo profundo as relações trabalhistas e o desemprego cresceu em clara evidência de ausência de suporte legal e de proteção social. Para os que conseguiram se manter empregados, as transformações no modelo de prestação de serviços foram sentidas de modo intenso.
Destacaram-se três aspectos fundamentais neste período: (i) a capacidade de adaptação e de criatividade para superar crises; (ii) a proteção do emprego e proteção da renda; (iii) a mudança de paradigma de contrato de trabalho.
As empresas foram obrigadas a se acomodar diante da situação ainda não muito bem controlada, mas tiveram nos primeiros momentos que desenvolver forte capacidade de adaptação para criatividade a fim de que as crises fossem superadas quer pelo trabalho remoto ou por meio de teletrabalho.
O trabalho remoto que se praticava de modo pouco aderente nos contratos de trabalho, sempre gerando uma desconfiança relativamente ao prestador de serviços tornou-se fundamental e se reafirmou.
Na capacidade de adaptação e de criatividade para superar crises duas considerações: o crescimento do trabalho por aplicativo e a reinvenção de metodologia de trabalho em todos os seguimentos.
O trabalho por meio de aplicativos revelou uma readaptação não de uma forma consciente de relação de trabalho, mas uma salvação para quem estava em situação de pura necessidade de prover seu sustento e da família. Não se trata, na sua maioria, de um sonho ou realização, mas de superação de sobrevivência.
De qualquer forma, sonho ou não, o momento revelou absoluta falta de proteção social, com marginalização dos trabalhadores, razão pela qual, as manifestações coletivas dos chamados entregadores, ainda coloca em evidência a necessidade de alguma forma de proteção social.
Os demais segmentos da prestação de serviços foram estimulados ao trabalho remoto e à revisão de conceitos em torno da boa-fé.
A proteção do emprego e proteção da renda na pandemia parece ter sido o primeiro foco socorrista e que se impôs necessariamente pelo menos como aviso de que haveria um suporte do estado ainda que sofrível para manter a renda e o emprego, com garantias de salários, compensando as empresas que mantivessem a preservação dos empregos com fundamento na situação de calamidade pública.
Finalmente e de modo obrigatório a mudança de paradigma de contrato de trabalho se instalou de forma irreversível e inexorável. O trabalho remoto ganhou expressão e passou a ser o grande motor da dinâmica empresarial, especialmente naqueles casos em que a prestação de serviços presencial não era relevante.
A interação de trabalho passou a ser baseada na confiança e na boa-fé, com maior valorização da responsabilidade contratual assumida. O controle da prestação de serviços deixou de ser visual e restringiu-se ao âmbito do prestador que, necessariamente, tem o dever de demonstrar sua integração e interação com a proposta de relação contratual de trabalho. Dito de forma outra, a boa fé nas relações emergiu e passou ao patamar do indiscutível. Aquilo que se dizia em torno do uso dos equipamentos telemáticos fornecidos pelo empregador no ambiente de trabalho, ficaram no passado.
A ética e comprometimento foram privilegiados e passaram a ser a tônica de relações de trabalho contínuas e construtivas, com absoluta valorização do compliance nas relações contratuais de trabalho.
Talvez pudéssemos ter tido iniciativas do Governo Federal por meio de seguro-desemprego para aliviar os encargos trabalhistas e fiscais das empresas ou de incentivo fiscal com propostas de incentivo à prática de isolamento.
Todavia, tivemos um verdadeiro silêncio do governo federal que vem agora com as Medidas Provisórias 1045 e 1046 tentar aliviar o impacto de sofrimento e de incertezas da economia e da proteção social. São sempre benvindas, mas são tardias e insuficientes.
*Paulo Sergio João é advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Fundação Getúlio Vargas
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