*Silvania Tognetti
Aguarda sanção presidencial desde o dia 4 de dezembro o Projeto de Lei 4.458/20, que reforma a Lei de Recuperação Judicial. Além de diversas alterações importantes para o tema das empresas insolventes, como o tratamento da insolvência transnacional, há alterações também tributárias na Lei 10.522/2002, permitindo parcelamentos e transação especiais para empresas em recuperação judicial. Enquanto aguardamos a sanção presidencial, farei algumas considerações sobre o texto do referido Projeto de Lei.
A Lei 10.522/2002 que trata do Cadastro de Inadimplentes (CADIN), com a alteração da Lei 13.043/14, permitiu às empresas em recuperação judicial o parcelamento de dívidas tributárias em 84 parcelas mensais e consecutivas, que seguiam percentuais de amortização diferenciados ao longo do tempo. O Projeto de Lei traz novas regras para este parcelamento e introduz normas especiais de transação tributária para as empresas em recuperação judicial.
O Projeto permite o parcelamento de débitos fiscais em 120 meses, incluindo débitos constituídos ou não, inscritos ou não em dívida ativa. As parcelas a vencer no primeiro e no segundo ano serão calculadas com a aplicação do percentual de 0,5% e 0,6% respectivamente. O restante deverá ser pago em 96 meses.
Quanto aos débitos que ainda estiverem na Receita Federal, será possível reduzir a dívida em até 30% com a utilização de prejuízos fiscais e bases negativas da Contribuição Social sobre o Lucro ou ainda com a utilização de créditos próprios do contribuinte. Neste caso, o restante deverá ser pago no prazo máximo de 84 meses, com prestações definidas a partir dos percentuais de 0,5% e 0,6% sobre o valor da dívida, nas prestações do primeiro e segundo ano, respectivamente, com a liquidação do saldo em 60 parcelas.
Será também possível parcelar valores de imposto de renda retido na fonte e IOF retido e não recolhido, mas para pagamento em apenas 24 parcelas.
Entretanto, muita atenção, porque a exclusão deste parcelamento autoriza a Fazenda Nacional a requerer a convolação da recuperação judicial em falência. Este é um tema bastante delicado porque não se reconhecia o direito de a Fazenda Pública requerer falência, tendo em vista a posição especial de seus créditos na falência e o fato de dispor de vias próprias para exigir o crédito tributário. Neste aspecto, destacou-se este ano uma decisão proferida pela 1ª Câmara de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, que acolheu pedido de falência formulado pela Fazenda Nacional (Apelação Cível 1001975-61.2019.8.26.0491). É uma decisão isolada em meio ao entendimento majoritário da ausência de legitimidade da Fazenda Pública (STJ, REsp 164.389/MG, Rel. Sálvio de Figueiredo, DJ 16.08.2004, p. 130). Acreditamos que este ponto é controverso juridicamente e também pode ter consequências práticas assustadoras.
Do ponto de vista prático, há risco de uma eventual banalização de pedidos de falência pela fazenda pública como acontece com os protestos e penhoras online, que deveriam ser expedientes para fortalecer a posição de credora da fazenda e passaram a ser aplicados em qualquer caso, sem avaliação das consequências desastrosas para o contribuinte. Antes de procurar bens, já se pede penhora online e será uma tragédia se antes de procurar bens, a fazenda decidir pedir falência dos contribuintes. Não é disto que se trata o Projeto de Lei, mas a admissão do conceito de que Fazenda pode pedir falência pode ser um passo decisivo.
Adicionalmente, o Projeto prevê regras especiais para que os contribuintes em recuperação judicial ingressem com transações tributárias na forma da Lei 13.988/20. Aumenta o prazo para quitação para 120 meses com limite máximo de reduções de até 70%. Entre as informações a serem prestadas pelo contribuinte, exige que demonstre que a eventual alienação de bens no âmbito da Recuperação Judicial não prejudicará os compromissos assumidos com a transação. Além disso, o projeto faz constar que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão por lei própria a aplicação da transação tributária a seus créditos.
O prazo final para sanção presidencial é 24 de dezembro e, provavelmente, começaremos 2021 com novas possibilidades para as empresas em recuperação judicial.
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