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Foto do escritorVera Moreira

Compliance: quando a adesão é descabida

Ricardo Inglez de Souza

Implementar e assegurar a efetividade do programa de compliance é fundamental, mas a adesão obrigatória ao programa alheio que vem sendo inserida em cláusulas contratutais de muitas empresas pode não ser o melhor caminho.

As regras de integridade ou compliance são fundamentais para a vida das empresas e dos executivos, uma vez que criam cultura saudável, previnem e detectam violações pontuais. Servem, em última análise, para preservar o valor da empresa e a integridade dos direitos de seus colaboradores.

As penalidades para as empresas incluem multas pesadíssimas e outras restrições que podem, eventualmente, impedir a empresa de participar de licitações ou de ter acesso a linhas de financiamento público ou a benefícios fiscais.

multas - compliance

Para os executivos, além dos problemas reputacionais e de recolocação no mercado de trabalho, pode gerar multas e a temida prisão em casos mais extremos.

Numa postura extremista, porém, algumas organizações têm adotado a exigência de adesão, da parte de empresas parceiras, a seu programa de compliance. Essa tendência poderá gerar o caos contratual e não necessariamente garante maior segurança ou certeza de conformidade que aquela alcançada pela previsão contratual de obrigação de seguir as leis e respeitar os padrões éticos dos negócios.

É cada vez mais comum haver questionamentos sobre a exigência que algumas empresas veem fazendo para que seus clientes e fornecedores adiram aos seus programas de compliance. Essa exigência não pode ser considerada ilegal, mas pode gerar muitas complicações práticas, que têm reflexos jurídicos.

Imagine-se, por exemplo, um fornecedor de serviços de segurança privada. Ele pode ter mais de uma centena de clientes corporativos. Se cada um desses clientes tiver seu próprio programa de compliance e se todos exigirem a adesão do fornecedor aos seus programas, teremos a situação de que essa empresa de serviços de segurança privada terá mais de cem regras para cumprir. Não bastasse a obrigação de cumprir essa infinidade de normas, poderá ter que conviver com normas contraditórias ou ter a obrigação de implementar diversos sistemas de controle e treinamento distintos para atender a todos os programas que teve a obrigação de aderir. Além disso, terá que se manter atualizada a respeito de qualquer mudança havida em qualquer dos programas.

O que termina ocorrendo, muitas vezes, é a adesão pró-forma. O fornecedor sucumbe à exigência dos clientes para se manter no mercado, mas não incorpora efetivamente o programa do cliente. Na maioria das vezes, essa situação deixa o fornecedor em situação de inadimplência. E os contratos são bastante rigorosos quanto a este aspecto. Incluem, muitas vezes, a suspensão dos pagamentos e até mesmo a rescisão motivada. Vivem e convivem, fornecedor e cliente, em instável situação.

É possível haver, ainda, situações em que a obrigação de adesão seja juridicamente questionável.

Mesmo a empresa que obriga a adesão pode estar assumindo um ônus que não imagina, uma vez que, sempre que o programa previr o treinamento de todos os aderentes, será obrigada a treinar seus empregados e os terceiros que aderiram. Além disso, havendo qualquer edição ou alteração no programa, será obrigada a notificar, e, muitas vezes, negociar, com clientes e fornecedores, a adesão ao novo texto.

É bastante compreensível essa tendência de obrigar o cliente ou fornecedor a aderir ao programa de compliance. Além de mais simples, dá uma supostaimpressão de maior zelo e rigor. Porém, alcança o mesmo resultado que obrigar o cliente ou fornecedor a cumprir as leis e seguir os padrões éticos da empresa. Só que custa mais caro. A discussão na negociação é maior e, se for levado a sério, o cumprimento custa muito mais também.

Já que não é o formato mais efetivo e pode gerar custos operacionais e conflitos contratuais (na negociação e na execução do contrato), a adesão apriorística e compulsória de clientes e fornecedores ao programa de compliance das empresas é descabida e deveria ser evitada.

*Ricardo Inglez de Souza, sócio de Inglez, Werneck, Ramos, Cury e Françolin Advogados

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