Na semana passada estive no IV Simpósio Internacional de Desenvolvimento da Primeira Infância, promovido pela Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, da qual faço parte como voluntária no Comitê de Comunicação. Como o assunto é extremamente envolvente e os temas abordados têm meu interesse pessoal, sempre saio com a cabeça borbulhante de pensamentos. Desta vez não foi diferente, funcionou como riscar um fósforo perto da pólvora e o questionamento principal que surgiu foi: qual o real papel da comunicação na sociedade?
Só posso concluir que é enorme e essencial, no entanto, feito com tamanha irresponsabilidade da nossa parte, profissionais da área. Exemplos que transformam esta teoria em verdade não faltam. Para começar, tenho dois exemplos vivenciado por todos. O primeiro é do cigarro. Foram feitas inúmeras leis transformando o fumante em um condenado, colocadas imagens chocantes nas embalagens dos produtos e uma restrição implacável a publicidade deste tipo de produto. Mas o mais importante, que é trabalhar a conscientização em massa dos males que o cigarro causa, não foi feita. E se foi, não foi eficiente. Conscientização requer comunicação, feita com cuidado, lógica e respeito ao seu público. Tratar o problema através da proibição não o resolve, apenas o ameniza. Neste caso especificamente me parece até que houve certa mistura entre legislação e comunicação. De alguma forma, a sociedade passou a negar sua existência e não trata-lo: não ver o fumante não significa que ele não exista.
Outro caso similar é o do Estatuto da Criança e do Adolescente. De que adianta um estatuto se não temos pais, mestres e cuidadores preparados para educar uma criança, que no futuro próximo pode se tornar um adolescente problemático? Novamente colocou-se regras, mas não se colocou à luz, a causa. Como consequência não a tratamos, como sociedade, com o devido cuidado. Dessa forma, não há como esperar resultados satisfatórios. Hoje, sabemos por estudos científicos que a criança, desde a gestação, absorve tudo o que acontece e portanto vai reagir de alguma forma a isso. Não se divulga que nos primeiros anos de vida é que 80% da capacidade cognitiva da criança se forma. Este nível de informação, esclarecedora, importante, crucial, adaptada aos diversos públicos, não chega a grande massa da população. Fica restrita a grupos que se esforçam herculeamente para conscientizar o maior número de pessoas possível, tentando criar uma agenda positiva sobre a questão e impactar a sociedade com um caminho que indica para uma real evolução.
Não condeno a realização das iniciativas citadas, porque é melhor ter algo do que não ter nada, mas condeno o papel do comunicólogo que talvez deixe de questionar quando tem a oportunidade. Nós, profissionais de comunicação, nos tornamos “fazedores” e deixamos de ser “pensadores”. Deixamos, com raras exceções, de considerar as relações de causa e efeito, não planejamos considerando a forma de absorção da informação do seu target e sua forma de reação. Trabalhamos sob a ditadura das metas de vendas, dos resultados, dos ROIs, e deixamos de fazer perguntas que podem levar nossos clientes a um resultado muito mais consistente e mais promissor. O pensamento e as estratégias estão automatizadas, parecem todas iguais, mesmo que sejam para produtos e mercados diferentes. Vale a nossa reflexão sobre o nosso real papel como profissionais e na sociedade, pois ela é a reprodução do nosso dia-a-dia, dos nossos lares, dos ambientes que frequentamos. Se nos acomodamos como profissionais, certamente também estaremos acomodados como cidadãos.
Marta Fujii é sócia fundadora da agência Fit Live Marketing, há 27 anos no mercado publicitário.
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